
A gente está cansado, prefere não lutar, deixar que tudo aconteça naturalmente – sem regar nenhum fruto brotará da semente, mas a gente não se convence disso, nos sentimos deuses, superiores, senhores do destino, no lugar de poesia damos ordens: “abra a perna para que eu entre” e o mundo vai perdendo o que é sagrado, foram anos de batalha até aqui e agora que conquistamos dizemos que é lixo depois que usamos no máximo duas vezes, na terceira já perdeu a graça, já não nos faz nenhum favor, já é um saco.
Antes éramos a exceção, agora viramos a regra, abrimos a porta mas só até a metade, não há mais entrega, conversamos e rimos da dor, nossa fome nunca que cessa, cada vez mais e mais precisamos desta sensação de que pertencemos a alguém de que alguém nos pertence, a sensação é tudo o que nos resta porque daqui a pouco será outra festa, outra cama, outra obscenidade no ouvido, outro crime a ser cometido, assassine para não ser assassinado. Foto: Ricardo Pereira/ modelo: Line