segunda-feira, 30 de agosto de 2010

esta noite e quantas mais tivermos

Por mim tudo bem, não diremos nada a ninguém, guardaremos só para nós, esta noite e quantas mais tivermos. Importa o que sentimos, não as explicações que dermos, a cumplicidade é um estágio difícil de atingir, a maioria nem chega perto. Contei quantas ‘pintinhas’ seu corpo têm, não tinha nada para fazer além de te achar linda, você dormia como se fosse minha refém, mas era assim que eu me sentia. Quis saber o que eu pensava de uma tatuagem, sonha fazer mas lhe falta coragem, desenhei como ela seria na sua pele com a ponta dos dedos, comecei em volta do umbigo, onde a terminei é segredo. Fiz um poema enquanto você se vestia, deixei embaixo do seu travesseiro, com aquelas palavras que segundo me dizia, arrepiam seu corpo por inteiro. Posso te ligar no meio do dia, apenas para ouvir a sua voz, quem sabe até te deixe vermelha, lembrando de quando estamos a sós. Sempre nos despedimos sem saber se vamos nos ver novamente, aquela bem pode ser a última vez entre a gente, por isso você parece me morder como se quisesse me prender entre os seus dentes. Foto dela: Ana Martins, ‘japonesa de pequim’.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

microcosmo

Fingi que dormia, ela se movia pelo quarto sorrateira, devagar, não queria me acordar, pensava no que me diria além de ‘bom dia’, mal sabia como tinha vindo acabar naquele lugar. Lembrava-se de uma festa, da banda que tocava, de que ria e não conseguia parar, que ‘barba por fazer’ a enlouquecia, depois que me mordia, que meu corpo a prendia, que não queria se soltar – e de como tudo isso lhe parecia agora tão distante: sabia quem era a mulher que se vestia, mas não se reconhecia na mulher de antes, ainda que esta lhe parecesse bem mais interessante. Eu não tinha como ajudá-la, não a conhecia, embora ela não me fosse de toda estranha, talvez até já a tivesse trazido uma noite para cá, a música estava alta, não ouvia direito o que me dizia pouco antes de começar a me beijar. Ela me observava em pé ao lado da cama, pensava como de costas parecia-lhe com todos os homens com que já esteve, ainda mais quando não se lembrava de seus rostos, embora sua boca ainda guardasse o meu gosto. Tirou um pedaço de papel da bolsa, mas nada escreveu, conferiu se havia esquecido algo, mas nada esqueceu. Fechou a porta atrás de si e saiu, ainda vi quando seu táxi dobrou a esquina e sumiu, pensava que se a visse novamente não sei se a reconheceria e que, talvez, aquela noite se repetisse infinitamente entre a gente como algo me dizia já se repetiu. Foto dela: Ana Martins ‘na ponta dos pés’.