sábado, 1 de março de 2008

carol sem explicação

Ela foi falando e eu achei que cabia

Eu tenho uma história também. Acho que é mais uma forma da gente sobreviver por mais um tempo na vida do outro, isto de contar o que é tão íntimo, o que a gente acha que pode mudar alguma coisa. Mas se você quiser eu mudo de assunto: falo só que estou com pressa, que não sei como vim parar aqui, que esta noite era para ser definitiva e ela só está me matando. Você me deu seu último cigarro, achei que isto era importante, contava, é que eu não vivo na mesma lógica que a sua, eu tenho um outro conjunto de regras, eu recolho vira-latas na rua, já me cortei bastante também, eu sei quando algo se esfacela nas nossas próprias mãos.

Mas eu estava dançando até agora, você viu como eu parecia feliz? Queria que aquela música não parasse nunca porque existem festas demais eu sei mas é que entre uma e outra é como se eu não tivesse nada inteiro. Foi por isto que você me convidou e eu vim, não tem nada de especial naquela cama bagunçada, meu corpo não explica nada, é como ter sede e beber água, eu posso me levantar e sair andando como se não estivesse sangrando. Você é que acha que eu nunca vim aqui, eu já vim aqui milhões de vezes nos últimos meses, você é que não tinha essa barba nem tinha lido todos estes livros. Fui eu que permiti e não você quem me dobrou. Embora o gosto na boca seja o mesmo para ambos.

Pode ser que amanhã eu deite e role e que você me traga sua alma na bandeja. Não tenho certeza, não tenho certeza de mais nada, nem do que aconteceu nem do que vai acontecer. Eu só não queria que tivesse esses momentos em que tudo congela, a gente fica dividido entre milhões de coisas, será que me mando, será que consigo não levar um pouco de você comigo. Eu ficaria bem de personagem sua, você me controlaria, faria amor comigo em vez "disso" e eu suspiraria. Inventa um outro ritmo para mim, um outro cigarro do nada, faz mágica, qualquer truque que eu acredito, algo que não nos devolva ao mundo real depois que acaba. Não quero acordar e descobrir que é a vida.
Foto: Julia Sweet, da série Hello Stranger, 2005.